Salve
Deus!
Meu
filho Jaguar!
Explica-se
a diferença entre a velha estrada e o no caminho.
A
velha estrada é cheia de medo, de temor a Deus. A velha estrada palmilhada por
milhares de pessoas, milhares de teorias sempre escritas e nunca praticadas. O
caminho, entretanto foi traçado pelo suor, pela própria energia de quem o
traçou e vive a emitir com tanto amor.
Vamos
sentir o caminho do Amanhecer, sem superstições e sem as teorias dos pensadores,
pela vivência na prática, na execução desta Doutrina e seus fenômenos
sensoriais.
Vamos
senti-lo no respeito a dor alheia, no carinho aos humildes, no afeto das
ninfas, no progresso e na compreensão de nossa família.
Este
é o caminho traçado para o Homem na Doutrina do Amanhecer.
Que,
diria que naquela Era distante os Enoques levassem tão alto esta filosofia esta
Corrente.
Sim,
Pai João, o mais velho, era quem observava com mais precisão o desenrolar das
vidas nos carmas. Suas preocupações
aumentavam enquanto Pai Zé Pedro filosofava de vez em quando.
Os
dias passavam sem qualquer anormalidade, isto é, sempre acontecendo fenômeno
que ali já era corriqueiro. Porém só Deus sabia como e aonde chegariam. Havia
dias alegres e outros menos alegres, porém sempre em harmonia.
Até
que as forças foram se materializando e tudo começasse a ser mais verdadeiro, mais
preciso.
Pai
João se inebriava com todos aqueles fenômenos e estava sempre a espreita dos
mínimos acontecimentos. Sempre cochilando em baixo de uma pequena árvore.
O
pequeno arraial estava tranquilo quando Pai João, em um dos cochilos, viu um
finíssimo fio magnético entrando numa cabas, ao mesmo tempo em que ouviu o
grito desesperado de alguém fora atingido.
Era
um fenômeno mediúnico, puramente espiritual. O grito era da jovem Iracema que rolava com uma dor na
espinha, como se tivesse levado uma pancada.
Pai
João então correu e fez uma “elevação” tirando-lhe a dor.
Ele
então começou a pensar que nada havia enxergado, no entanto tinha certeza de
ter visto aquele fio saindo da cabana do feitor.
Chamou
então Pai Zé Pedro e contou-lhe o que vira e os dois começaram a ter medo da
situação.
Nisto
Jurema, manifestada por um caboclo
começou a dizer:
-“Meus
filhos! Tomem cuidado, esta feitor é um instrumento feliz de evolução. O pobre
infeliz vive ainda pelas mãos caridosas de Sinhá Sabina. O fenômeno foi visto
por vosmissê João, para que tome cuidado!”.
-
Como? Perguntou Pai João.
- “Ele vai entrando em transe –
respondeu o caboclo – e sua alma ruim odiosa, pega a quem ele mais ama ou
odeia”.
- Salve Deus! – Disseram todos de uma vez.
- E eu pensava que somente os
desencarnados atuavam...
- “Sim – continuou o caboclo – vocês
estão em uma jornada para desenvolvimento, até que passe todo o carma da
escravidão”.
- O Homem será feliz quando tiver a
libertação – disse Pai Zé Pedro.
- “Não – continuou o caboclo – O
Homem jamais se libertará”.
E dizendo isso deixou Jurema e se foi.
Todos ficaram sem entender nada. Jurema, porém entendeu e saiu correndo
dali para a cabana do feitor, decidida a falar com ele e dizendo que iria
matá-lo, quando Pai João, interferiu dizendo:
- “Jurema, a concepção de Morte resulta de um entendimento
completamente errado da Vida, porquê na verdade ela jamais existiu. O Espírito
não morre e então o feitor nos atentará mil vezes mais. Matando-o ele ficará
mais leve, mais sutil”.
-“Todos os que se perdem pelo
pensamento e se enchem de ódio, ao serem desencarnados e no astral inferior, é
evidente que voltam, sendo mais comuns as suas furiosas crises”.
- “Vamos Jurema, vamos tentar doutriná-lo antes que morra e se torne
invisível aos nossos olhos”.
Chegaram
à cabana do feitor. Ele estava esticado numa cama de vara e capim. Sabina veio
sorrindo ao encontro deles. O feitor começou a espraguejar e Pai João a lhe
fazer doutrina, porém com medo de Jurema
que o observava seriamente com seus olhos verdes e amendoados.
Sem
perceber, disse então Pai João:
-
“Pobre imperador! Viestes com tão nobre missão e, no entanto eis o que restou!
Pensa Eufrásio, no que estou te dizendo. Vou levar Jurema e voltarei”.
O
dia já estava terminando quando Pai Zé Pedro e Pai João se encontraram de novo
e se entenderam. Pai Zé Pedro deslumbrado ficava repetindo:
-“A
irradiação dos encarnados se desprende do corpo e manifesta com a mesma leveza
do espírito dos mortos...”.
Nisto
se ouviu um grito e em seguidas gargalhadas; Pai Zacarias caira na Cachoeira e
estava todo molhado, porém nada havia lhe acontecido senão o susto. Coisas
dessa espécie aconteciam sempre.
Sim,
mas essa alegria durou pouco. Chegou o feitor da fazenda onde Jurema vivia.
Todos
se assustaram com o visitante.
Ele
chegou arrogante e já ia pegando Juremá
quando Tomaz gritou:
-“Larga,
porco imundo! – aqui é diferente, nem tanto porque você vai morrer”.
O
feitor esporeou o cavalo e marchou para Tomaz e num relâmpago passou por cima
dele com o cavalo, esmagando o seu estômago. Quando Pai Zé Pedro e Pai João
chegaram era tarde demais. Tomaz já estava morto!
Todos
gritaram fazendo um ambiente de terror naquele lugar.
O feitor
foi fugindo desapercebido levando Juremá.
Aquela dor era grande demais e ninguém se
lembrou do feitor assassino e nem de Juremá.
A
morte de Tomaz trouxa tanta tristeza que mudou sintonia do lugar. Os Nagôs não
cantaram mais e nas fogueiras riam algumas vezes. A harmonia, porém continuava.
Começaram
então os projetos para irem buscar Juremá.
Tomaz
fora quase criado por Pai Zé Pedro.
Dois
Nagôs que muito amavam Pai Zé Pedro, resolveram buscar Juremá. Calados, sem que ninguém soubesse, puseram uma matula na
mochila e se foram sem que ninguém soubesse.
Jurema, porém os viu na sua vidência.
Pai
João por sua vez sentiu tudo que estava se passando.
Todos,
porém se fizeram de desentendidos e ninguém impediu os dois Nagôs.
Jurema não olhava para Pai João e nem Pai Zé
Pedro, pois viviam ainda o espírito de vingança pelo seu querido Tomaz.
E
realmente Joaquim e Cassiano chegaram com Juremá.
Novamente
o reboliço.
Juremá não falava, perdera a voz.
Todos
queriam saber o que houvera, porém nada diziam e ninguém tinha coragem de
perguntar. Permaneciam em volta da fogueira e só se ouvia o murmúrio da
Cachoeira. Ninguém tinha mesmo coragem de quebrar aquele silêncio.
De
repente Jurema deu uma risada,
Janaína foi para perto dela e as duas se abraçaram, Jurema, porém mantendo uma
atitude que não era dela disse:
-
Salve Deus! – e chamando Joaquim e Cassiano disse:
-
Por que fizeram isso? – mataram o feitor e seu sinhozinho! Isto não é de um
filho de Deus e que está a caminho! Terá que voltar a terra e receber o feitor
como teu filho. E tu Cassiano terás o teu sinhozinho também como filho!
A
estas alturas Cassiano e Joaquim já sabiam o que Jurema queria dizer.
-
Me perdoe, bom espírito – disse Joaquim – porém aquele malvado matou nosso
Tomaz em sua covardia!!!.
Cassiano
por sua vez, perguntou ao espírito incorporado em Jurema se eles poderiam continuar vivendo ali.
-
Sim, disse o espírito. Deus não tem pressa. Cada um daqui assumirá a sua
sentença ou sua libertação.
Juremá enchia-se de cuidados por Jurema.
Tão
logo terminou a incorporação cada um voltou ao seu estado d’alma. Uns foram
dormir e outros ficaram ali na fogueira.
Nisso
ouviram gritos lascinantes!
Meu
Deus! Novamente o fio magnético. Novamente Iracema
fora atingida pelo feitor Eufrásio!
E
tudo se repetiu com as mesmas correrias, até que Pai João liquidou novamente o
assunto com nova elevação, desta vez, porém com muito trabalho.
Mais
dias decorreram e se notou que Iracema
ficava cada dia mais pálida, com ar doente. A partir daí tudo foi de mal a
pior.
Certo
dia fizeram uma vidência para saber o que deveriam fazer com a pobrezinha da Jurema. Dela participou Vovó Cambina,
que viera da Bahia para tirar o quebrando dos filhos da Sinhá. E na sessão
daquela noite ela decidiu seguir os seus irmãos naquela jornada.
Vovó
Cambina da Bahia “rezou” Iracema e
esta com seu passe magnético começou a melhorar. A partir daí, na proporção em
que ia se fortalecendo, ia também adquirindo forças para repelir o magnético do
feitor.
A
essas alturas, porém as coisas já haviam tomado um vulto muito sério.
Ninguém
se lembrava mais de Tomaz. Toda a concentração agora era no feitor Eufrásio.
Urgia fazê-lo amigo antes que ele os atingisse. Isso porque Pai João explicara
que se doutrinassem o feitor ele deixaria de atacar com seu magnético. A partir
daí o feitor começou a receber constantes visitas e foi melhorando tanto que
chegou a pedir perdão muitas vezes.
Eufrásio
passou então a ser o confidente daquele povo!
Sim,
Eufrásio fora um grande senhor até o dia que perdera a sua fortuna e sua família
devido ao jogo. Com isso fora obrigado a aceitar o triste lugar de feitor
naquela fazenda de tragédia.
Mais
uma vez a prova de que Homem se liberta por si mesmo...
Sim,
enquanto Pai João e Pai Zé Pedro ensinavam a sua doutrina de amor, o feitor ensinava
também o que sabia dos mundos por onde andara.
Vovó
Cambina da Bahia também o “rezava” todos os dias.
E a
vida do arraial, sem ter perdido sua harmonia, só agora, entretanto voltava ao
normal das toadas e das alegres fogueiras.
Certo
dia, estavam todos assentados, quanto ouviram um barulho no mato, como se fosse
um estouro de boiada arrastando tudo...
Eles
então carregaram suas espingardas e se entrincheiraram...
Era
uma vara de porcos selvagens que por ali passava, felizmente por fora do
arraial. Assim mesmos os Nagôs mataram mais de 20 porcos fazendo fartura de
carne.
Pai
Juvêncio e Zefa eram os únicos que tinham coragem de ir até um lugarejo por
nome Abóbora.
Certa
feita, chegavam na entrada da cidadezinha, quando Pai Juvêncio viu uma mulher
com uma menina meio desacordada nos braços. Ele chamou Zefa e cochichou no seu
ouvido. Ela concordou com o que ele disse e ambos benzeram a menina, isto é,
tiraram o espírito que estava com ela. A menina ficou boa e Tânia, sua mãe deu
a ele algumas frutas que tinha, se desculpando por não ter mais nada.
Juvêncio
e Zefa comeram as frutas, trataram dos assuntos que os havia trazido a cidade e
voltaram para casa. Ao chegarem, nem bem haviam pisado na soleira da cabana
quando sentiram uma violenta dor. Suas barrigas começaram a doer, doer, tanto a
ponto de chamarem Vovó Cambina da Bahia para socorrê-los.
Seria
veneno?
A
disenteria piorava e os dois apresentavam os mesmos sintomas.
-
Pobrezinhos! Dizia Pai João. Resolveram tantas coisas para nós nessa viagem!
Deve ser provação, deve ser Deus testando seus corações.
Logo
mais a noite, todos estavam em torno da fogueira e pedia notícias. Súbito Jurema, que estava ao lado de Pai Zé
Pedro, levantou-se bruscamente e, apontando para os dois que estavam
abaixadinhos junto a fogueira gemendo de dor, disse:
-
Eles comeram prenda, ganha pela sua caridade!
-
Como! Disse Pai João.
-
Ah! Sim Pena Branca não quer que a gente ganhe nada em troca do que faz!
-
Sim, Vovó Agripino também já disse:
- A
gente só aprende com o espinho na carne ficando!
-É
Pai João, todos nós temos um espinho na carne!
Oh!
Meu Deus! Gritaram todos de uma vez, sim estamos conscientes!
Nessa
altura, graças a deus, Vovó Cambina já estava chegando com a cuia de chá. Eles
após tomarem o chá contaram o que havia acontecido na entrada de Abóbora.
Todos
então abraçaram os dois pela sua ação e cantaram em coro;
-
Juvêncio e Zefa comeram prenda da caridade que fizeram!
-
Sim, receberam pagamento e o Pena branca não gosta de presentes ou de cobre!
Zefa
e Juvêncio ainda tiveram uns três dias de dor na barriga.
Tudo
foi alegre e passou.
Eufrásio,
que agora era o conselheiro do grupo também achou a lição muito importante.
Primeiro pelas frutas, uma vez que Pena Branca não aceita paga pelo seu
trabalhador mediúnico e segundo pela denúncia de Jurema, que em sua clarividência vira o que se passara.
O
pobre casal fora lesado pelas suas mentes preguiçosas.
E
tudo está espiritualmente pronto.
Pai
Zé Pedro e Pai João se regozijavam da situação. Zé Pedro sempre perguntava:
- O
que será de nós, aonde iremos? O que será de nós? Não seria melhor sairmos, em
vez de esperar o Mundo aqui? Eu já não suporto mais! Oh! Meu Deus!
-
Zé Pedro, dizia Pai João, quando o celeiro está pronto, o Mestre aparece! – são
palavras de Vô Agripino!
Pai
Zé Pedro, Pai Lourenço, Pai Francisco e muitos outros dos 70 membros daquele
grupo estavam inquietos. Menos Pai João e Eufrásio o feitor, que firmes em Vovô
Agripino, permaneciam calmos.
Certa
manhã Jurema avisou o Pai Zé Pedro que chegaria muita gente para se curar. Os
Nagôs se reuniram e se prepararam para recebê-los. Fazia já dois anos que ali
estavam.
-
Lá vem eles, lá vem eles!
Lá
embaixo avistava-se uma enorme fila de gente chegando.
Só
se ouvia correr para receber os chegantes.
Zefa
e Juvêncio reconheceram entre eles a mulher cuja menina haviam curado e
gritaram:
- Jurema, Pai João, Pai Zé Pedro, são
gente que vem em busca da caridade! E perguntaram baixinho a Pai João:
-
Não tem perigo de nossa barriga doer?
-
Não, respondeu Pai João.
E o
povo foi chegando e fazendo ambiente.
Que
maravilha! Todos estavam felizes, a felicidade dos missionários de Deus!
Tudo
foi lindo com suas curas desobsessivas e seu amor, a dedicação de toda aquela
gente.
Meus
filhos, eu gostaria de contar mais desta história, porém Manezinho, o 7° raio
de Yucatã na me deixa. Sabe por quê? Porque ele é também um personagem da
Cachoeira do Jaguar.
E
você também, meu filho, procure se encontrar nela.
Com
carinho
A
mãe em cristo.
TIA NEIVA
Vale
do Amanhecer, 08 de março de 1980