22 de junho de 2017

O Amanhecer das Princesas na Cachoeira do Jaguar: Capítulo III

Salve Deus!
Meu filho Jaguar!
Não estamos preocupados com os velhos documentos das velhas escrituras, porém estamos, sim, desejosos de saber onde os nossos antepassados encontraram tanta força e tanta coragem para chegar até aqui. Sim, meus filhos, o missionário tem, graças a deus, a sua energia e toda harmonia nos três reinos de sua natureza. Muitas vezes contando, até pensamos ser irreal o que nos dizem sobre os escravos e seus missionários.
Vejam filhos. O Congá estava em festa, quando alguém anunciava que os Ferreiras já haviam cercado o Congá e queriam Juremá a todo custo. Pai Zé Pedro, mais evoluído do Pai João, foi tentando segurar o povo do Congá e qual não foi sua surpresa, os crioulos novatos já haviam saído de dentro de casa e como loucos açoitavam os Ferreiras fazendo-se ouvir pragas, ameaças e gemidos!
O feitor que estava do lado dos Ferreiras, sentido que estava perdendo gritou:
- Sou o feitor desta Fazenda. Estes Nagôs imundos estão me assassinando. Socorro!
Só se ouvia o urro do feitor, pois na escuridão daquela noite, foram atingidos na coluna ou na espinha, ficando inerte no chão gritando como um louco. Pai Zé Pedro foi até o terreiro onde estava a briga e logo viu que o feitor estava aleijado para sempre.
- Oh! Meu Deus! Gritou Pai Zé Pedro. Como poderemos assumir tal dívida com este pobre irmão! Nisto, alguém que ouvia, gritou:
- Eu acho muito bom que ele nunca mais caminhe para chicotear os outros.
- Meu Deus, Meu Deus! Dizia Pai Zé Pedro andando de um lado para outro. Oh! Meu Deus! Este pobre homem que não vai nunca mais andar... Caminhando, deparou com um outro triste quadro. Efigênia, uma jovem negra, estava ali também com o crânio aberto de pancadas. Era filha de Júlia, uma paralítica. Zé Pedro não resistiu e foi buscar o seu Sinhorzinho. Sim, nenhum dos Ferreira havia morrido e quis Deus, nem mesmo ferido. Foi então que um dos quarenta, que ainda não havia se manifestado, de um urro e se manifestou dizendo:
- Salve Deus!
O sol já começava a esquentar seus raios, então o Nagô, Pai Jerônimo disse:
- Levanta acampamento, leva Jurema e Juremá. Escolhe o teu povo e segue ruma à Cachoeira do Jaguar, que desemborca nas águas grandes do mar. Nós, os Nagôs ficamos. Vamos buscara desditosa mãe destas gêmeas – disse apontando para Jurema e Juremá.
- Não! Eu não permitirei, gritou Zé Pedro.
- Como? Disse Pai Jerônimo. Como se atreve a duvidar de teu irmão? Vão embora que eu a levo. Se demorarem terão mais mortes. Vamos, vamos logo. E desincorporou. Salve Deus! Zé Pedro e Pai João não esperaram mais. Não se sabe como, juntaram suas coisas ajudadas pelo Sinhorzinho e partiram dali. Só no caminho notaram que não faltavam ninguém e inclusive o feitor lá estava, numa cama de vara. O Sinhorzinho e a Sinhazinha despediram-se com amor. Quando já iam longe, ouviu-se um forte estampido, era um tiro de cravinote.
Os negros do terreiro, que já estavam de volta, e o Sinhorzinho com sua família, com ajuda dos escravos que ficaram, enterraram os mortos e sugiram para a cidade onde moravam seus pais. Enquanto as crioulas contavam 108, faltando Jerônimo, que ninguém sabia do paradeiro. Já era noite chegaram à Cachoeira do Jaguar. A lua cheia clareava as matas e o mar, as palmeiras balançando suas folhas como uma prece. Pai Zé Pedro sentando em uma pedra descortinava todo quadro por onde teria que passar com aquela gente.
Pai João chegou e os dois começaram a fazer os seus projetos.
- Sim, diziam. Tudo pela condenação da matéria. A Terra.... A Terra, disse Pai João. Tão lindo o mar, no entanto a Terra é o que nos pertence, por ser a parte sólida deste planeta. Porém o que me conforta é que as forças cósmicas continuam em atividade, porque neste universo não há inércia, tudo se movimenta em nosso favor pela benção de Deus. A sua atividade é essencialmente produtora desta nossa matéria orgânica e inorgânica, logo nos dará novas forças, graças a Deus. Pai Zé Pedro que só ouvia, disse sorrindo:
- Onde aprendeste tanto? Isto não são palavras de Nagô.
- Estou consolando a mim mesmo, Pedro. Porque não pede ao Mestre Agripino? Ele é que me consola. Foi quando os dois começaram a receber energia.
- Sim Zé Pedro, a atividade do homem é essencialmente produtora e as forças essencialmente ativas. Como já disse cria na matéria orgânica este arsenal de forças, portanto temos que organizar um ritual, uma jornada, vestimentas que mudem a sintonia dos crioulos.
- Sim, Zé Pedro, vamos erguer esta arma para o Céu.
- Sim, João, é realmente um arsenal. Oh! Meu Deus! E olhando a paisagem do lugar disseram:
- Faremos uma jornada em frente a Cachoeira, guarremos as penas, enfeitaremos as crioulas e faremos lindas princesas dos castelos encantados que já ouvi contar.
- E eu que pensei que você meu irmão, era um simples escravo!
- Sim, disse Pai João, tenho Agripino que vem nos meus sonhos e me conta tudo.
- Eu também tenho um índio que me falava quando eu ia entrar no chicote do feitor. Riram, riram muito, de repente lembram do feitor.
- Meu Deus! O que vamos fazer com este pobre homem? De repente ouviram um grito. Era Jerônimo gritando, como se  estivesse perseguido.
- Oh! Meu Deus! Nossa vida na tem fim. E os dois continuaram a sorrir.
- Sim, e o ritual? Disse um.
- Faremos, disse o outro. Precisamos de energia para obter as curas desobssessivas. Salve Deus! Faremos tudo que Deus nos aprouver.
Salve Deus! Meu filho Jaguar. Domingo vindouro lhe darei a continuação. Com carinho.
A mãe em Cristo. 

TIA NEIVA