21 de junho de 2017

O Amanhecer das Princesas na Cachoeira do Jaguar: Capítulo II



Salve Deus!
Meu filho Jaguar!
Deus, de fato, toma cedo ou tarde o partido dos que se dizem inocentes. Porque o Cristianismo surgiu por canais piedosos numa Era difícil. A alma e o perispírito são sempre os mesmo e, por esta força se opera pelo compromisso ao Etéreo e se desenvolvem na vontade de Deus.
Sim, Jurema dormia, os escravos na sabiam sair da senzala e o dia começava a raiar. Pai Zé Pedro pediu a Pai João que a deixasse a seus cuidados, que ele determinaria outros pra zelar da pequena Jurema. Pai João era recente escravo naquela senzala.
O feitor chegando inesperadamente à soleira gritou e todos tomaram um ruma, exceto Pai Zé Pedro, que segundo, era protegido do Sinhozinho.
- Quem é essa crioula Zé Pedro?
- Está Jurema, que desde ontem não quer se levantar. Está sofrendo pela mãe que está no tronco.
- O que? Disse o feitor.
- Quem já viu uma crioula com mimo destes? Mimo é para Sinhazinha. Vou levantá-la agora mesmo com este chicote. E marchando para a cama de Jurema fez menção de levantar o chicote, quando se ouviu o grito de Pai Zé Pedro:
- Se arremessar, eu o mato. E o seu grito foi tão grande que se fez ouvir em toda redondeza, enfurecido mais ainda o feitor que arremessava o chicote de qualquer jeito, blasfemando horrores e ameaçando de contar ao Sinhozinho de Jurema, o seu destino.
- Não, gritou Pai Zé Pedro. Não fará. Os Ferreiras são muito malvados, não fará. Ouviram a risada sarcástica do feitor. Então não se sabe como, centenas de negros apareceram, intimidando o feitor com apenas as suas presenças. Nagôs que já tinham ganho sua forria pela velhice e pela doença. O feitor, que agia escondido do Senhorzinho saiu dali calado e foi avisar o Senhorzinho de Jurema. Foi um reboliço. O Senhor de Pai Zé Pedro mandou chamá-lo e pediu notícias do que estava acontecendo. Pai Zé Pedro disse que havia sido por mal criação da pequena crioula.
- O que devemos fazer? Enquanto falava, o Senhor de Jurema já esta na senzala e como um raio já tinha Jurema desmaiada em seus braços espraguejando de raiva.
- Tanto a mãe como as filhas são feras, são irresponsáveis, são negras malvadas, imundas. Estes Nagôs, não tinham palavras para suas blasfêmias.
De repente, ouviu-se um estampido na serra e todas correram para olhar ou chegar mais perto, quando todos gritavam:
- Afastem-se, afastem-se!
 Juntam as armas, atire!
Não deixem que eles desçam até aqui.
Sim, todos corriam abandonando a Fazenda, menos Pai Zé Pedro e Pai João que correram para proteger os seus Senhores da Casa grande.
Era horrível. Trapos de negros revoltados pela escravidão. Arrebentavam tudo por onde passavam, matavam as crianças, levavam o que podiam, inclusive animais e etc.  Em meio daquele pânico, os negros desceram. Pai Zé Pedro na soleira gritou em voz alta:
- Parem, parem!
Um silêncio muito grande se fez ouvir. Os negros estacaram e ficaram como que petrificados.
- Sigam seus destinos. Levem algumas leitoas e vão-se embora.
Tem alguém no tronco, gritaram.
- Não, aqui não encontrarão nem tronco. O meu Senhor é o meu filho, continuou Pai Zé Pedro. Nisto Pai João saiu de trás de uma árvore muito grande que tinha na frente da Casa Grande e um crioulo em cima de um cavalo deu um tiro, pegando no ombro de Pai João. Jurema já havia se libertado do senhor, pois o Senhor ao ver os negros jogou Jurema no chão e saiu correndo. Jurema saiu correndo da senzala para socorrer Pai João.
- Queremos o Senhor branco! Gritavam os negros
Pai João com ternura disse:
- Chega, chega, Deus pode castigar! O ódio é amigo da fome. Voltem para seus donos, as onças vão lhes comer nestas matas. Deixem de ódio, vamos desçam, eu não tenho medo de vocês, dizia Pai João morrendo de dor.
- Sim vamos descer, disse um velho africano, e num pulo já estavam juntos de Pai Zé Pedro. E se sentaram no terreiro como se quisessem ouvir o que Pai Zé Pedro queria dizer. Pai Zé Pedro começou a falar e perguntar a razão de suas fugas, o porquê de estarem fugindo. Eles contaram então a sua história.
- Éramos trinta, entre homens e mulheres e crianças. O nosso Sinhorzinho entregou-nos pro feitor e todo dia morria nêgo de apanhar, então resolvemos sair matando até encontrarmos sossego.
- De onde vocês vêm?
- Viemos da Fazenda Esperança, no Engenho Velho.
- Como? O Engenho Velho fica muito longe daqui. Meu Deus! Disse Pai Zé Pedro. Os negro como se estivessem enfeitiçados, disseram:
- Vamos ficar aqui, se o senhor deixar. Obedeceremos e não aborreceremos ninguém.
- Oh! Meu Deus! Gemeu Pai Zé Pedro, já temos muitos negros. Nisso de lá gritou uma crioula marcando seus trinta anos.
- Eu sei tecer e dia, desde que me dê algodão. Desceram mais ou menos umas oito crioulas, entre 18 e 35 anos e negros também nesta idade.
Chame o Senhor, se adiantou o tal Jerônimo, que parecia dominar  a tropa.
Nisto, o Senhor sai na varanda e os negros se ajoelharam no chão, pedindo perdão como crianças. Eram almas em busca de luz, mariposas encandeadas pela luz. Desta vez foi diferente, os negros é quem decidiram a situação. Foram se acomodando na senzala, deixando Pai Zé Pedro preocupado.
Foi fazer uma vidência daquele quadro realmente, e ali cochilou e entrou em transe.  Viu todo aquele grupo de velhos e tradicionais centuriões da antiga e já distante Roma. Viu também Pai Seta Branca.
- Calma, calma José Pedro. Estes centuriões que hoje são negros estão sob tua tutela. Foram seus algozes e entre eles estão também Messalina, Policena, Emeritiana, hoje na figura de Zefa. Salve Deus, José Pedro! Amor, tolerância e humildade!
E assim desapareceu.
Pai Zé Pedro despertou com o barulho deles. Sim, e João? O que vai pensar? Como irá entender isso? Oh! Meu Deus! Como me libertei? Nisso Jurema vem correndo ao seu encontro.
- Pai Zé Pedro, Pai João! Eu vi um índio muito lindo que me falou sobre estes negros! Eles são nossos e vieram para nos salvar do meu Sinhorzinho.
Pau João deu uma risada e disse:
- Salve Deus! Eu não o vi, porém senti tudo que passou. Jurema! Tu és minha filha! Eu e a sua mãe somos dois amores. Os três se abraçaram, quando se ouviu a voz do Sinhorzinho, dono da Fazenda.
- Eu quero também me confraternizar neste abraço. Zé Pedro. Você salvou as nossas vidas. E virando para Jurema disse:
- Vou comprar a tua mãe e a tua irmã, a Juremá. Os quatros pulavam de alegria com as cabeças juntas, também em um só coração. Depois, como se despertassem daquela felicidade, disseram:
- Hoje faremos a maior festa no Congá. Olhando os velhos jaguares, negros ou centuriões, estavam batendo o pé e palmas, cantando uma linguagem Nagô.
- Oh! Meu Deus! Disse Pai Zé Pedro a Pai João:
- Emeritiana está ali e Antera também! O que será de nós João?
Disse Pai João com calma, segurando no ombro ferido:
- Onde está o amor, está à compreensão!
Sim, à noite foi um grande preparativo para a festa no Congá. Os tambores começavam a tocar, os chegantes pareciam tão disciplinados como os outros. De repente, ouviu-se um grito. Era Iramar que acabava de chegar esbaforida. O povo da Fazenda dos Ferreiras estava cercando a Fazenda e iam levar Jurema. Foi pânico. Ninguém se entendia, até que Pai Zé Pedro novamente comandou todo o povo que lhe obedeceu. Salve Deus! Porém, todo o povo ficou em suspense.
Foi horrível.
Na semana vindoura, saberemos o resto. Salve Deus! Meu filho Jaguar.
Procure sempre se encontrar nesta história, nestas personagens. Que a compreensão esteja contigo, para que a felicidade possa alcançar-te. É o que te deseja.
A mãe em Cristo. 

TIA NEIVA 

Vale do Amanhecer. 15 de dezembro 1979